Joelson trabalha como freelancer a alguns anos, trabalhando com ilustração, character design e histórias em quadrinhos, e para esta entrevista fiz algumas perguntas sobre o lado bom e ruim do dia-a-dia de quem trabalha por conta própria. Vamos falar sobre os caminhos para conseguir trabalhos, rede de contatos, estudo constante e algumas histórias engraçadas............. mas prometo citar o fato de ele estar sempre derrubando as coisas no caminho, como cadernos, livros, copos, cadeiras, mesas, xícaras de café...
Pessoas, com vocês Joelson:
1 - Começando com uma pergunta básica: quando começou seu interesse pelo desenho e o
que te fez pensar em fazer disto sua profissão?
JS: Pois é, cara. Essa é pergunta é engraçada. O meu interesse mesmo começou lá pelos meus 9 anos, porque eu queria mesmo era chamar a atenção das meninas da minha sala. Eu lembro que tinha um guri na minha turma que desenhava muito bem para um moleque da idade dele, e um dia eu vi ele rodeado por uma turma, na maioria meninas, vendo ele desenhar. Aí, eu me aproximei e vi que ele desenhava um disco voador. Logo em seguida eu falei “Ah, mas isso eu também sei fazer!” Todo mundo olhou pra mim, e então eu fui desafiado a fazer um disco voador melhor do que o que ele tinha feito. Nunca havia desenhado um disco voador antes, mas parecia fácil pra mim desenhar um. Aceitei o desafio e me sentei numa carteira ao lado dele e comecei a desenhar um disco voador numa folha de caderno. Então eu comecei a pirar no disco voador, inventando traquinalhas, armas laser, enfim...Parecia mais a nave que aparece no filme Distrito 9. Eu e o outro moleque ficamos disputando quem fazia o melhor disco voador e quem ganhava mais atenção da turma e das meninas, é claro.
No final das contas, a turma havia curtido mais o meu desenho porque ele era mais elaborado. E, desde então naquele ano, eu sempre era disputado pelos colegas de turma para os trabalhos onde era preciso fazer desenhos. Consegui sim, uma atenção maior por parte das meninas, mas eu era muito tímido e não consegui sustentar a atenção delas por mim durante muito tempo. Apartir daí, eu vi que eu podia pôr numa folha de papel quase tudo aquilo que eu imaginava e eu podia fazer cópias quase indênticas de outros desenhos que eu via em gibis. Como tomei gosto pela coisa, nunca mais parei de desenhar conforme eu crescia, ao contrário do outro guri que não se dedicou mais e eventualmente acabou desistindo.
2 - O seu traço é bem estilizado, com características bem próprias e cartunescas. Você sempre buscou este tipo de resultado ou foi algo que surgiu com o tempo?
JS: Eu sempre curti desenho cartum, na verdade. Mas quando eu decidi me aperfeiçoar, eu estudava mais anatomia e fazia desenhos mais realistas, porque considerava importante. Como o acesso a livros de anatomia era praticamente impossível pra mim naquela época, eu copiava fotos de pessoas que eu via nas revistas (É, a Playboy também!)*. Mas tudo mudou quando eu conheci os desenhos do Bruce Timm (ô nomezinho difícil de pronunciar sem que soe como um palavrão). O estilo dele me cativou muito, e cativa até hoje, na verdade. Então, eu passei a copiar tudo o que eu via dele, porque eu queria desenhar daquele jeito. Queria ser tão bom quanto ele.
*Joelson, seu safadinho!!
3 - Como você conseguiu o primeiro trabalho com sua arte?
JS: Consegui o meu primeiro trabalho com meu professor de histórias em quadrinhos, e hoje amigo, José Aguiar. O José é um grande quadrinhista curitibano que já publicou diversos álbuns, tanto aqui como no exterior e é um forte nome do quadrinho nacional. Ele havia notado a minha habilidade e confiou a mim os primeiros serviços freelances da minha carreira. Mais tarde eu tive a honra de ser o seu assistente, fazendo pequenos serviços de limpeza dos desenhos dele, e tirinhas que ele publicava na Gazeta do Povo, e muitas vezes até fazendo alguns desenhos. Como eu tinha que fazer os desenhos no estilo de cartum dele, acabei sendo influenciado também. Mas isso não era problema pra mim, porque eu adorava os cartuns dele. Eram sempre muito expressivos e exagerados na medida certa, sem serem forçados. Foi ele também quem me apresentou o Photoshop e me ensinou a usar uma tablet.
4 - Quando trabalhamos juntos na Techfront, lembro de você enchendo cadernos com sketches
que retratavam pessoas que você via pelas ruas de Curitiba. Fale um pouco sobre esta fase dos seus estudos e como foi para você ter tantos ilustradores ao seu redor:
JS: Nessa época eu tinha a necessidade de soltar mais o meu traço, encontrar soluções gráficas mais rápido. E como as pessoas estão em constante movimento, esse era um excelente exercício. Então, na hora do almoço eu colocava o meu sketchbook debaixo do braço e ia numa praça que tinha lá perto. Eu me sentava num banco e observava as pessoas que passavam por lá. Tinha gente que me achava maluco, mas eu estava pouco me lixando pra elas.
Eu estava sob forte influência do Stephen Silver, que é um outro grande artista que eu admiro muito, e ele sempre falava sobre a importância de se praticar sempre e de carregar um sketchbook pra onde você for. Geralmente ele postava vídeos dele no Youtube, onde ele aproveitava o momento em que ele aguardava a limpeza do carro, ou um vôo no aeroporto, pra observar e desenhar as pessoas ao seu redor. Assim ele praticava sempre. Ele também fazia transmições semanais ao vivo do seu estúdio em Los Angeles, onde ele falava bastante sobre motivação, dava dicas de como seguir na carreira e coisas do tipo.
Uma outra dica que ele dava também era a que ele chamada de Memory Sketch, onde ele observava uma pessoa por breves segundos e depois tentava fazer um desenho de memória dessa pessoa. Tem até um blog onde alguns artistas fazem isso e postam os seus desenhos. Segue aí link.
O bacana de você trabalhar com outros ilustradores é a troca de experiências. Tem sempre alguém que sabe algo que tu não sabe e a gente aprende muito com isso, sem falar das parcerias e amizades que tu faz, porque são pessoas que praticamente tem os mesmos gostos que o teu, e tu pode conversar sobre tudo relacionado a arte. Melhorei muito as minhas habilidades com o Photoshop quando trabalhei lá, graças ao meus colegas de trabalho que não se importavam em me dar dicas e me ensinar novas técnicas.
5 - Você tomou a difícil decisão de apostar na sua carreira e viver de freelancer. Como foi este
início, a sua busca por colocação no mercado? Como você conseguiu os primeiros trabalhos e
quais foram suas dificuldades iniciais?
JS: Pois é, eu não comecei como freelancer porque eu queria, mas foi porque eu não encontrei uma empresa que me pagasse o suficiente para o meu sustento. Então, optei por trabalhar por conta própria. No começo foi muito difícil mesmo, porque eu estava muito inseguro se eu iria conseguir me manter, se eu iria conseguir trabalhos. Mas aí eu montei um portfólio e mandei e-mails pra diversos lugares. Também gritei pra todo mundo que eu conhecia que eu estava disponível como freelancer e então alguns trabalhos começaram a aparecer.
6 - Viver do próprio trabalho não é apenas desenhar e receber, existe toda a parte burocrática
de negociação, contratos e ainda passar notas fiscais e pagar inúmeros tributos ao governo.
Como é lidar com toda esta parte técnica de ser um profissional que trabalha por conta
própria?
JS: Complicada. Essa parte é chata, até hoje eu fico tenso quando eu preciso fazer uma proposta de
orçamento. Mas tem que ser feito, né? Não dá pra fugir.
7 - Muitas vezes, viver como freelancer é complicado por não haver uma renda fixa, podendo o
profissional em um mês ganhar o equivalente a meses de trabalho e em outros não conseguir sequer um contrato. Como você lidou com estas situações no início e como é hoje em dia?
JS: Bem, no início eu tive que cortar praticamente todos os meus gastos, então, não ia ao cinema, balada, não pedia pizzas e procurava gastar o mínimo possível e evitava fazer dívidas que era pra eu não ter algo a mais com que me preocupar. Hoje em dia eu consigo fazer essas coisas, graças a Deus, mas sempre fico de olho pra não exagerar e acabar ficando no vermelho.
8 - Recentemente você assistiu a um workshop com Stephen Silver, character design de séries como Kim Possible e Danny Phantom, que você vivia citando. Fale sobre a importância de eventos como este e como foi para você, como admirador do trabalho dele, conhecê-lo pessoalmente?
JS: HAHA! Eu acho que vocês me achavam um pé no saco, de tanto que eu falava sobre o Stephen Silver. Bem, que a busca por aperfeiçoamento é fundamental, isso todo mundo sabe, ou deveria saber! Ainda mais se tu trabalha por conta própria. Estar sempre em busca de aperfeiçoar o seu traço e participar de workshops e oficinas é um grande meio de o artista fazer isso. Não dá pra ficar parado no tempo.
Nesse workshop que ocorreu na Melies em São Paulo, eu tive a grande chance de conhecer Bobby Chiu e o Stephen Silver, que é um grande ídolo pra mim por conta da sua arte, da motivação e paixão que ele tem pelo que faz. Foi muito bacana e motivador conhecer o processo de criação dele e como ele consegue se manter criativo. No final do workshop, tive a oportunidade de conversar como Bobby Chiu e o Stephen e mostrar o meu portfólio pra eles. Os dois são gente finíssima e me deram dicas valiosíssimas pra melhorar as minhas ilustrações.
Outro ponto importante de tu participar de workshops e oficinas é o networking. Todos estão mais abertos e receptivos a um bate-papo e tu pode conhecer muita gente. Geralmente eu sou um pouco tímido, mas eu me forço a me aproximar e conhecer as pessoas.
9 - Em julho de 2011 rolou a edição de número 0 da Gibicon em Curitiba, onde você acabou conhecendo (e impressionando) o agenciador italiano Tommazzo d'Alessandro. Conte esta história:
JS: Pois é, um conhecido meu na época havia me ligado dizendo que esse agenciador estaria no evento pra avaliar portfólios. Como a avaliação era no dia seguinte, sábado, e esse meu conhecido havia me ligado na sexta a tarde, larguei tudo o que eu estava fazendo e corri pra imprimir algumas ilustrações que eu havia feito, mas não havia impresso nada ainda. Preparei meu portfólio, e no dia seguinte eu estava lá.
Sinceramente, eu não estava esperando pela reação que ele teve quando viu o meu trabalho. Ali mesmo ele me perguntou se eu teria interesse em assinar contrato com ele e me deu seu cartão de visitas, me pedindo pra eu mandar o meu portfólio por email. Após o contrato assinado ele me passou alguns testes, mas infelizmente não deu em nada ainda, já que a concorrência é muito forte, tanto aqui quanto lá fora.
10 - Uma pergunta de costume: todo desenhista admira o trabalho de vários artistas, mas existem aqueles especiais, que a gente vê e fica um tempão olhando o trabalho enquanto uma
bába tenta escapar pelo canto da boca. Cite APENAS 5 que fazem com que seu queixo caia, e não vale trapacear como o Paulo Ítalo fez na entrevista anterior:
JS: Então, alguns eu já havia citado antes, mas vou falar novamente:
- Bruce Timm, cujos desenhos eu copiei a esmo e, mesmo eu não querendo mais, ele ainda continua me influenciando, assim como influenciou uma geração de ilustradores pelo mundo todo;
- Stephen Silver, Character Designer responsável pelo visual da Kim Possible, entre outro;
- Bill Pressing, que faz umas pinups lindas e eu fico com raiva só de olhar. Inclusive eu tenho vontade de aprender a pintar com aquarela por causa das pinups dele;
- Ben Caldwell, um quadrinhista americano que é dono de um traço cartum espetacular, na minha opinião. Adoro como ele desenha as mulheres;
- Miah Alcorn, dono de um traço cartum muito maneiro e carismático. Adoro os personagens que ele faz.
Na verdade, esses são apenas alguns de muitos. Gosto muito de ver o trabalho de outros artistas na web, mas esses são os que mais me agradam em particular. Deixo as ilustrações desses caras exibindo como slide no meu desktop. Pra quem usa o Windows 7, tu pode tu pode selecionar uma pasta com imagens e configurar pra que elas sejam exibidas no desktop uma por uma.
11 - Fale um pouco sobre o seu processo de trabalho, desde o momento em que você recebe o briefing, o desenvolvimento da ideia, a busca por referências e o que faz para se concentrar, já que por trabalhar em casa o profissional freelancer tem sérias tendências a perder o foco por causa das obrigações domésticas:
JS: Bem, não tem muito segredo. Geralmente o cliente me passa um briefing do que ele está precisando. Se o briefing está muito vago pra mim, eu faço muitas perguntas até eu ter bem claro o que ele quer. Peço também pra que ele me mostre referências do que ele tem em mente. Depois de tudo bem claro, eu faço os esboços e mando um preview, e o cliente vai me dizer o que deve ser alterado ou se estou no caminho certo. Depois da aprovação do preview, eu parto pra finalização digital, onde eu faço o traço em preto, jogo as cores e o que mais for preciso para deixar a ilustração do gosto do cliente.
Tento ao máximo não me distrair com outras coisas e procuro seguir um horário de trabalho, e pra me concentrar no que eu estou fazendo, sempre escuto músicas ou ouço alguns podcasts, o que ajuda aliviar aqueles dias de marasmo.
12 - Costumo ver você presente em fóruns e galerias virtuais como Deviantart e CG Hub, inclusive com seus trabalhos tendo destaque nas páginas iniciais constantemente. O quão importante é manter esta presença virtual e os contatos com ilustradores pela web? Isso abriu
portas para trabalhos no exterior?
JS: Então, eu vejo esses fóruns como vitrines, onde posso expor os meus trabalhos e até conseguir clientes através deles. Sempre tive uma recepção calorosa das pessoas que vêem os meus trabalhos no CGHub e no Deviant Art e até consegui alguns clientes através desse último. Acredito que todo artista deve utilizar ao máximo essas ferramentas para divulgar os seus trabalhos. É o que eu sempre recomendo quando algum aspirante a ilustrador me pergunta o que ele deve fazer. Eu sempre digo pra eles exporem os seus trabalhos na internet constantemente. Quem não é visto não é lembrado.
Felizmente, algumas portas tem se aberto pra mim e boas oportunidades estão aparecendo. E espero que seja assim sempre.
Bueno, meu caro Joelson, agradeço muito pelo tempo cedido, e pra fechar vou fazer algo sugerido pelo Paulo Ítalo após a última entrevista, e lhe pedir que fale algo para a galera, alguma mensagem ou mesmo uma história que tenha acontecido com você durante sua carreira que queira compartilhar com todos. Desde já agradeço e desejo muito sucesso ao amigo.
JS: Eu é quem devo agradecer o espaço, cara. Fico honrado em conceder essa entrevista e devo lhe parabenizar pela iniciativa, que dá a oportunidade de se conhecer muitos outros artistas feras que tem por aí. Estarei de olho sempre nas próximas entrevistas.
Pra finalizar, a mensagem que eu gostaria de passar pra quem estiver lendo essa entrevista é que tenha tesão pelo que tu faz. Isso é o que vai fazer tu continuar seguindo em frente, apesar dos pesares. E gostaria também de deixar duas frases que estão sempre martelando na minha cabeça:
-“Be so good they can’t ignore you.”, que quer dizer “Seja tão bom que eles não possam te
ignorar”, dita pelo ator Steve Martin.
- “It’s a funny thing; the more I practice, the luckier I get”, e quer dizer “É engraçado. Quanto mais pratico, mais sorte eu tenho!”. Dita por Arnold Palmer, um jogador de golfe americano. Deixo vocês com essas duas frases pra refletirem.
É issaê! Se quiserem ver os meus trabalhos, visitem o meu blog e curtam a minha Fan Page no Facebook! Um abraço galera e até a próxima!
Bueno, gurizada, espero que tenham gostado desta entrevista. Estarei falando constantemente com profissionais que estão no mercado nas diversas áreas de atuação de um desenhista para tirar as muitas dúvidas de quem está pensando em entrar no mercado, e já tem entrevista pras próximas semanas, galera.
Mas bueno, por hora é isto. Hasta luego, indiada!!
2 comentários:
Show de entrevista Jô! posso dizer que o dom de desenhar veio muito antes dos 9 anos né? hehehehe
Eliane
Show de bola a entrevista cara, parabéns pelo blog!
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